VOCÊ É SUA PRINCIPAL REPRESENTAÇÃO
- Phran Noctuam | Arte: Polly Nor
- 20 de dez. de 2016
- 3 min de leitura

É muito fantasioso esse universo que criamos na esquerda de que nós mulheres periféricas militantes (com nossos diversos recortes) sempre somos fortes e que nossa vida é só tombamento. Na verdade, nossa vida é tão difícil ou pior que as minas que nunca nem ouviram falar na militância.
Infelizmente, só a informação e conhecimento não nos livra das opressões que a sociedade impõe, pelo contrário temos que suportar e ser resistência e além disso temos a responsabilidade de disseminar esse conhecimento com as manas que não tem acesso.
Se por sermos mulheres temos inúmeras jornadas, sendo mulher indígena/preta, gorda, mãe, estudante,lésbica (etc) temos muitas outras jornadas em acúmulo e com a missão da militância só aumenta nossas funções e cargas. A luta para nós, mulheres resistentes, nunca foi escolha é questão de sobreviver, é uma guerra, ou mata ou morre, e no geral somos nós as vitimas. De acordo com o estudo, somos 169, 5 milhões de brasileiros, dos quais 50,79% são do sexo feminino. Deste percentual, 44% são mulheres negras e indígenas.
Muitas pessoas chegam em mim e me elogiam pela militância, fico contente que mesmo a partir de muita dor eu posso estar passando esperança pra outras mulheres e homens negros/indígenas, mas ao mesmo tempo existe algum tipo de glamour que as pessoas e eu (quanto pessoa também) transmite de uma forma a espetacularizar essa vida que não é fácil, o que por muitas vezes aparenta que não haja momentos ruins ou até mesmo falhas.
A luta pra mulher periférica já é em si revolucionária, pois se manter viva, consciente e em movimento é sobrenatural dentro das estatísticas que nos persegue e pra além é importante que todos os movimentos reconheçam e apoiem nossa luta, porque faremos sim uma revolução auto organizada, no entanto, precisamos de pessoas para nos ajudar com nossas crianças (mais espaços com creches), precisamos da ajuda com bilhete único (direito a cidade), precisamos de informação, precisamos que exista compartilhamento de conhecimento (direito ao conhecimento e comunicação), precisamos de espaços de fala entre tanta coisa, sobretudo de empatia.
A emancipação da ideologia dominante é um processo muito lento e que pode gerar muitos ruídos em nós. Como por exemplo: a competição entre coletivos, a falta de unidade, a falta de humildade e principalmente o não respeito com as pessoas que não tem as mesmas oportunidades que nós de estarmos em espaços de discussões, de ter conteúdos e equipamentos.
Por isso, quero lembrar a todas e todos que enquanto a mulher periférica e camponesa não for livre, nenhum homem negro será, nenhuma mulher será, nenhum movimento marginalizado será, nenhum coletivo ou projeto de esquerda será e que a liberdade não acontecerá neste sistema vigente.
Mas, afinal, qual a finalidade desse texto, se todxs já sabem qual difícil é a vida dessas mulheres?
A realidade é que ainda existem muitas pessoas que não sabem disso, outras que fingem saber, mas nunca procuraram sobre ou nem ao menos dedicaram algum tempo a ouvir uma mulher preta falar, isso dentro do movimento imaginem a classe trabalhadora em geral.
No entanto, o foco é que pra além de ser mulher preta militante somos pessoas, que também estão dentro do sistema, e mesmo que na maioria dos dias nos orgulhemos por sermos como somos, por sermos a favor de pêlos, o fim do padrão de beleza, pelo amor livre, pelo fim do capital, pelo reconhecimento e respeito as diversidades, entre todas as pautas de opressões e minorias. Nós muitas vezes nos sentimos feias, inseguras, frágeis e incapazes de ir contra tudo isso, e que ser referência para outras manas é por muitas vezes um fardo, uma responsabilidade que nasceu apenas pelo fato de ser como se é e falar o que muitxs não dizem e que por tanto é necessária uma paciência histórica, pois nem sempre temos tempo e-ou disposição para dizer naquele momento o que é colorismo, o que é padrão de beleza, o que é patriarcado, o que é gênero ou compor uma mesa ou mediar um espaço. Muitas vezes, nós mesmas nem sabemos de fato do assunto, ainda, também, estamos pesquisando sobre.
Esse texto é um grito ao movimento: Ajudem, nós, mulheres periféricas, nos apoiando e dando infraestrutura para que possamos superar o debate de mulher periférica e poder estar em outros espaços além do que nos é inerente, como espaços de conjuntura, de captação de recursos, de arte, de economia solidária, entre outros lugares e tempos que não podemos estar por sermos quem somos.
E ao mesmo tempo um lembrete as meninas-mulheres periféricas que esperam em mim e em outras manas uma representatividade universal que as contemplem:Você é a sua principal representação, é importante a vitória, a fala, o posicionamento das manas que você admira, mas você também pode ser essa mana, então fala mais, grite mais, seja o que você admira em alguém, se não conseguir sozinha, grita nois, mas faça sua parte também.
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