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THAMYRA THÂMARA DE ARAÚJO

  • Stephanie Ribeiro
  • 2 de mar. de 2015
  • 6 min de leitura



Thamyra é uma das mulheres mais inspiradoras que conheci, envolvida em diversas lutas, é um símbolo de empatia que tem sempre algo útil para agregar em qualquer discussão. Ela me concedeu uma entrevista e a cada resposta, demonstra seu poder, com entendimento interseccional e justo.



Thamy sempre te vejo bem ativa na militância em diversos recortes, você é uma mulher multi, está sempre lutando por todes, enfim, quais atividades que já desenvolveu até hoje, que destaca?



Eu fiquei três anos envolvida nas intervenções do coletivo Ocupa Alemão. Pensava tanto a comunicação com as ações em si. Organizamos várias intervenções pelo Complexo do Alemão e pela cidade (Rio de Janeiro) querendo refletir e suscitar o debate sobre o direito a cidade, a mobilidade e as políticas públicas que só chegam a determinados lugares e bairros do Rio de janeiro.


Muitas dessas ações estão no livro Junho: Redes e Ruas, onde tive a oportunidade de publicar um artigo, Junho Preto: Favelado Ocupando as ruas a maioria dos negros no Brasil moram nas favelas. Acho que não dá para fazer um recorte racial sem pensar no recorte de classes no Brasil.



Você participou da ESPOCC muitas pessoas não conhecem esse projeto, pode então falar um pouco dele? E atualmente é moderadora da página Anastácia Contemporânea, primeiro queria saber de onde vem esse nome, depois como essa página vem te aproximando de muitas mulheres negras, já que o espaço que vem contruindo é feminista e empoderador, como isso reflete na sua vida?



Eu fiz escola popular de comunicação crítica - ESPOCC em 2012, é um projeto do observatório de favelas e foi bastante importante na minha formação. Principalmente por propor a repensar o papel dos meios de comunicação e das representações das minorias. O pobre, o preto, a favela sempre estigmatizado na tv, no jornal, na fotografia corporativa.


Racismo sempre foi uma pauta nas minhas conversas principalmente no que diz respeito a mulher negra, seu cabelo e como ela é representada e vista na sociedade. O Coletivo Anastácia Contemporânea acabou nascendo de forma natural e entre amigas (Jessica CerqueiraAndressa Baptista, Letícia Santanna) a gente conversava, a gente conversava sobre isso sempre, queríamos ter um lugar para expor nossas ideias, para ter voz e quem sabe poder ser um espaço para que outras meninas também pudessem falar, se reconhecer como negra, se reconhecer em outra mulher negra e se fortalecer nessa luta diária.


Falamos do nosso processo de reconhecimento, sobre assumir o cabelo afro, mas acima de tudo a gente queria e quer mostrar que a mulher negra pode falar sobre tudo. Podemos falar do nosso cabelo que é resistência e das nossas lutas, mas também podemos falar de culinária, de sexo, de moda, de coisas triviais. Eu acho que somos polidas de todos os lados: de um lado não podemos falar, na mídia os estereótipos falam por nós, do outro se podemos falar só podemos falar sobre isso: sobre racismo, e nossa dor, acabam nos enquadrando outra vez.


Queremos (mulheres) ter voz, e nossas vozes sejam ouvidas, falar do que quisermos, nossa subjetividade vai muito além da cor da nossa pele, e do formato do nosso cabelo e por que Anastácia?



Isso.



Porque Anastácia foi uma mulher que lhe tiraram o direito de falar não apenas simbolicamente mas fisicamente, na história conta que tamparam sua boca, tamanha sua beleza e força. Imagina não poder falar? E quantas de nós não podemos falar simbolicamente, por isso acho que de certa forma somos Anastácias Contemporâneas andando por ai e buscando o nosso espaço.



Thamy, a mídia peca na falta de representatividade ou no esteriótipo, recentemente tivemos a série Sexo e as Negas, e agora virão outras personagens, eu até vejo que o aumento dos candidatos negros no BBB refletem a mídia que quer representar, mas silenciando e reafirmando preconceitos. A FARM fez uma campanha, com diferentes mulheres negras, e você estava nela. Como foi essa experiência? Enquanto representatividade que a marca tentou trazer quais lados destaca como positivos e negativos?



Acredito que o negro sempre teve ali de alguma forma na Tv e nos jornais. Mas eu não me sinto representada por aqueles personagens e a maioria também não. Quem quer ser a empregada doméstica de avental que só falava: "sim senhor"? (nada contra esse trabalho digno). A questão não é a profissão e sim a forma passiva e subordinada que essas profissionais são na maioria das vezes representadas. Quase todas a empegradas são negras sem historias de amor, a menina branca protagoniza tudo, e a negra se aparece é só como a melhor amiga. Os meninos negros são os marginais, o malandro, o safado.


O negro sempre esteve na TV vestido de "preto", o preto que nem o preconceito deles acredita que é, mas de fato nunca tivemos ali e mesmo agora, acho que não estamos por completo.


Destaco que nem empreguetes, com a Tais Araújo protagonizando, que gostei pra caramba era 100%, já que ela era única personagem que falava errado na cena. Por quê? Os negros que conseguem fazer papel na tv e sair dos estereótipos são os que batalharam anos, porque a maioria é enquadrado. Eu fico pensando a quem serve que esse estereótipo continue sendo reforçado? A quem serve?


Sexo e as Negas desde o inicio falou que ia mostrar algo diferente. Porém o programa estava errado desde o começo a partir do nome, não adianta só ter ator negro (máximo respeito a quem estava ali trabalhando e ganhando seu pão) tem que ter diretor negro. Um branco, classe média, por mais que seja bem intencionado não saberá representar o negro sem cair nesses "vícios" de representação.


Sobre a Farm, acho que é importante ter modelos negras nessas grandes marcas. Mas o que me preocupa é que não pode ser por que a campanha fala sobre isso. Modelos pretas nunca vi na farm, mas agora apareceu numa campanha sobre roupas e acessórios afros. Só assim que podemos ser representadas? Acaba caindo em outro estereótipo. Confesso que já estive mais animada com essa campanha.


Mas fui na abertura da loja da Farm em Ipanema do primeiro dia da coleção e fiquei tão triste. Imagens de mulheres negras no folder, as roupas lindas, mas só mulheres brancas comprando fora o turbante que estava 179 reais! Tem noção disso?!


Depois da experiência, fui refletir sobre coisas que ainda não tinha pensado, enfim tudo isso é um grande paradoxo até que ponto dialogar e até que ponto é melhor fazer Nós por Nós.



Como disse você é ativa em várias áreas, o que inclui a fotografia, tem algum projeto seu fotográfico que queira destacar? E por quê?



Sou aprendiz de fotógrafo todos os dias, porque fotografar é aprender a ler o outro, mergulhar num universo que é só dele e consegui captar isso nesse ensaio Deusa Negra.


"Deusa Negra: Que preto bonito é esse? Ah, essa negra é bonita. Ela é uma preta bonita. Quantas vezes já escutaram isso por aí? E quantas vezes comentários como esses passam como normais. Ela é preta, mas é bonita! Elogiar um homem ou mulher negros vem sempre com justificativa do lado. Apesar da cor é bonito. Ou geralmente quando se elogia um negro, reforça que esse ou aquela tem traços finos e por isso então um negro (a) bonito (a). Pensando no Ideal de beleza, quase sempre distorcido, usado como instrumento de poder para desqualificar ou elevar o outro. Foi assim nas propagandas nazistas é assim na associação do negro a figura do macaco. O ensaio fotográfico, em constante construção, Deusa Negra é uma utopia da existência de se perder e se encontrar constantemente dentro de si mesmo, por meio do sorriso que desnuda, na nudez que se reveste. A beleza da Deusa, DEUSA NEGRA dentro de você, no olhar, na boca, na pele. A ideia é brincar, brincar de si, brincar com outro. Em cada clique se descobrir no olhar do outro e vê aquilo que você ainda não viu em si mesmo. O 'feminino' que existe no 'masculino', o 'masculino' que existe no feminino''. Repensar o conceito do belo, se desfazer dos conceitos e transcender."



Thamy se pudesse dizer algo para várias mulheres negras se sentirem empoderadas o que diria?



Falando de Brasil (acho que nos Estados Unidos é diferente) a resiliência passa muito pelo nosso cabelo. Um dia encontrei uma garota que chegou em mim disse que acompanhava a página e tinha resolvido cortar o cabelo e tirar o alisamento. Ela estava linda, feliz, tinha se livrado aos poucos da ditadura dessas químicas loucas. Ela perguntava dicas e etc; combinei de fazer uma entrevista com ela e colocar na Page. Acabei enrolando e dois meses depois encontrei ela com o cabelo alisado de novo, ela me disse "Thamyra não aguentei a pressão" eu fiquei triste, é claro que vc pode ter o cabelo que quiser. Mas não por pressão ou por vergonha, tem que ser por escolha, amor, sabe? então eu diria.... Sei que é clichê mas na prática faz sentido rs.. SEJA VOCÊ MESMA NÃO IMPORTE AS CONSEQUÊNCIAS. SEJA...





VEJA AS FOTOS DO TRABALHO DEUSA NEGRA QUE THAMY COMENTOU NA NOSSA GALERIA.


 
 
 

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